Após a aprovação acelerada do Projeto de Lei Antifacção na Câmara dos Deputados, o Senado Federal abriu uma frente própria de revisão, determinada a corrigir falhas técnicas, eliminar riscos jurídicos e evitar impactos negativos sobre órgãos de segurança pública. O texto, que endurece mecanismos de combate ao crime organizado, chegou à Casa Alta sob intensa controvérsia — especialmente pela redistribuição de recursos apreendidos em operações e pela possibilidade de afetar o funcionamento da Polícia Federal e da Receita Federal.

O relator no Senado, senador Alessandro Vieira, assumiu a responsabilidade de conduzir uma “revisão técnica profunda”, como ele próprio definiu. O trabalho inclui uma depuração da redação legislativa, revisão de pontos considerados imprecisos e análise refinada da constitucionalidade. Para isso, estão previstas audiências públicas com especialistas em direito penal, autoridades da segurança pública, pesquisadores e representantes da sociedade civil. A expectativa é que o parecer seja apresentado rapidamente, embora o senador ressalte a necessidade de “rigor e equilíbrio”.

Entre os trechos mais sensíveis está o dispositivo que altera a destinação dos valores confiscados de organizações criminosas. Críticos afirmam que a versão que saiu da Câmara poderia reduzir recursos de órgãos responsáveis por investigações complexas e operações de grande porte. No Senado, porém, a sinalização é de que não haverá prejuízo financeiro para a Polícia Federal — um ponto considerado inegociável pelo relator. A equipe econômica também demonstrou preocupação com possíveis lacunas que afetariam a Receita Federal, responsável por operações de inteligência fiscal frequentemente conectadas ao enfrentamento do crime organizado.

O governo federal acompanha o processo de perto. Integrantes do Executivo têm defendido que o Senado faça uma análise “cuidadosa e responsável”, evitando retrocessos e eventuais brechas jurídicas que comprometam tanto a efetividade do combate às facções quanto a integridade institucional dos órgãos envolvidos. A postura do governo reforça o entendimento de que o PL precisa ser firme, mas tecnicamente sólido.

Apesar das divergências, Alessandro Vieira avalia que o projeto tem boa receptividade entre os senadores. Ele afirma que os ajustes necessários são majoritariamente de redação e calibragem, sem alterar a espinha dorsal da proposta — que endurece penas, amplia instrumentos de rastreamento financeiro e reforça mecanismos de repressão às organizações criminosas. Ainda assim, há parlamentares que defendem mudanças mais extensas, especialmente nas partes que tratam da execução penal e da competência de órgãos federais.

A tramitação no Senado se tornou, assim, um momento decisivo: será a oportunidade de transformar um texto considerado apressado em uma legislação mais consistente. Quando aprovado, o projeto precisará retornar à Câmara para nova deliberação, o que pode abrir espaço para novas disputas políticas.

O debate expõe, mais uma vez, o desafio de formular políticas de segurança pública capazes de responder à escalada do crime organizado sem comprometer o equilíbrio institucional ou atropelar garantias jurídicas. O resultado final do PL Antifacção poderá moldar não apenas o enfrentamento ao crime, mas também as relações entre Executivo, Legislativo e os órgãos federais encarregados de proteger o país.