A solicitação formal da Polícia Federal para que o tenente-coronel Mauro Cid e seus familiares sejam incluídos no programa de proteção a testemunhas marca um momento crítico na investigação sobre os atos antidemocráticos que visaram manter o poder após a derrota eleitoral de 2022. A medida revela a percepção de risco elevado que recai sobre um dos colaboradores fundamentais da investigação — e levanta importantes questões sobre os limites da proteção, a sequência dos fatos e o futuro do processo.

Cid, que atuou como ajudante de ordens no entorno do então presidente, firmou acordo de colaboração premiada com a PF. Esse acordo se tornou peça-chave para elucidar a articulação, as comunicações, a logística e o planejamento da operação que tentou subverter os resultados eleitorais. Em documento endereçado ao Supremo Tribunal Federal, a PF aponta que, em razão da natureza “sensível” de sua colaboração e do estágio em que se encontra a investigação, torna-se “indispensável à preservação da integridade física” de Cid e de sua família.

A previsão legal do programa de proteção a testemunhas garante mecanismos como sigilo, mudança de residências, custeio de segurança adicional e acompanhamento psicológico. A PF interpreta que o grau de vulnerabilidade de Cid — pela exposição ao ambiente de poder, pelo potencial de retaliações e pelo histórico das denúncias — justifica sua inclusão imediata. O caso será submetido à análise do magistrado relator e da Procuradoria-Geral da República, que decidirão os termos e o alcance da proteção.

Para o colaborador, essa medida vai além de segurança pessoal: simboliza um eixo estratégico da própria investigação. A proteção lhe assegura condições de permanecer ativo, seguro e acessível para os órgãos de controle. Sem essa salvaguarda, há riscos claros: retração de depoimentos, retração de colaboração ou até retirada do acordo — o que comprometeria não apenas o caso específico, mas o legado institucional de investigações de alta complexidade.

Por outro lado, a solicitação da PF catalisa debates sobre a confiabilidade, a visibilidade e os custos dessa proteção especial. Em termos práticos, a inclusão de Cid exigirá estrutura logística robusta — moradia secreta, equipe de proteção, deslocamentos discretos. E em termos simbólicos, levanta reflexões: até que ponto o Estado consegue proteger colaboradores em mega processos sem que isso se torne um privilégio ou uma operação paralela de governo? A sociedade, por sua vez, observa com atenção — e ceticismo — como essas engrenagens funcionam.

A atuação de Cid agora se coloca em dois campos: o da peça processual crítica e o da figura pública que transformou a delação em evento midiático. A junção desses dois pólos reforça sua vulnerabilidade: quanto maior o impacto de sua colaboração, maior o risco de repercussões adversas. A proteção não é mera formalidade, mas componente essencial para que o processo siga íntegro, com testemunhas seguras, acessíveis e dispostas a seguir o acordo.

O próximo movimento cabe ao Supremo: se o relator deferir a inclusão, será aberto caminho para que Cid e sua família entrem no programa federal e recebam as medidas previstas por lei. Se houver negativa, o panorama da colaboração e da investigação poderá ganhar contornos ainda mais complexos. Em ambos os casos, fica claro que o destino de um processo histórico se entrelaça à segurança individual de quem decidiu assumir o protagonismo de contar o que foi negociado, articulado e executado por trás das cortinas do poder.